Ela
nem sabia mais o que estava fazendo. Os óculos não lhe serviam direito,
escorregavam enquanto tentava se concentrar e tinha que recoloca-los no lugar.
A dor de cabeça que vinha das leituras com o óculos saindo do foco era um
presságio da noite. Seria bom se concentrar em outra coisa, falar de outra
maneira, pensar sobre si de uma forma não alienante do seu corpo. Cansava do
peso da armação, cujo percurso não mais se previa, e os próprios olhos já
haviam andado demais, ela ofegava. Ou talvez o fizesse, não saberia dizer,
saberia apenas o que sente. Ou o que vê, e as imagens são desonestas. Por trás
das palavras que tentava focar havia um homem, um homem inteiro, um homem
completo inteiro, erguido, ou assim ela via. Tudo o que ela sentia era fuga, o
que tentasse enxergar corria demais. Agarrou o lápis mas só o percebeu porque
viu.
Não
adianta se coçar, porque a coceira já estava além dela, sentia a coceira de
outra pessoa.
Também
já não sabia mais pensar. Sua imaginação batia por hábito e era igualmente intangível.
Ela podia ver o vento, ver o silencio, enxergar os vidros limpos – até o
besouro. Aí, seus olhos esbarram e o olhar se recolhe. Nada mais do que ela
pensa faz sentido. Não havia nenhuma cor, nem preto ou branco, havia restos e
coisas sem sentido. Já não pensa mais com palavras e por isso alguém escreve
esse texto por ela, com uma compreensão escurraçada.
Longos
períodos de inexistência
Longos
períodos de comunhão com o vazio
Comunicação
com os vidros limpos da casa.
A
insinceridade das palavras, do texto limpo e hermético, pra que ela mesma não
possa encontrar o que essas teias estão prendendo, do que se alimentam.
Estética, recorremos à estética. Se, afinal, não podemos incorrer a nós mesmas,
nos encontramos na forma. Estática.
No
meio dos emaranhados, um besouro frígido, ou congelado,
talvez
tenhamos errado a palavra.